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quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Saga dos professores



Juremir Machado da Silva

Cada país com os seus (maus) costumes. Na França, as manifestações de jovens quase nunca acontecem sem a queima de, pelo menos, uns 500 carros. Há quem desconfie até de um patrocínio da indústria automobilística para renovação da frota. Ou, ao menos, dos vendedores de carros usados. As seguradoras, em princípio, não gostam dessas manifestações de hostilidade aos veículos. Mas já teriam inventado um seguro mais caro incluindo catástrofes estudantis. Os agricultores franceses também gostam de queimar. É uma velha tradição nacional. Queimam prefeituras. Mas poupam os prefeitos. É verdade que os mais radicais gostariam de uma inversão. O que seria melhor no Brasil: queimar o Senado ou os senadores?

Não existe democracia sem caos, confusão, entropia. A democracia é o sistema do dissenso. Na verdade, a democracia é um equilíbrio instável de ordem e desordem. Em alguns momentos, a desordem é mais importante do que a ordem. Tudo, claro, depende do grau de ordem e desordem. A vida dos professores, no Rio Grande do Sul, não tem sido fácil. O papel de um professor de ensino fundamental ou médio é decisivo. Completa a educação familiar. Ou a substitui. É uma categoria que ganha pouco para desempenhar um papel fundamental na vida de uma pessoa. Nos últimos anos, os conservadores conquistaram o monopólio do insulto na mídia. Os professores passaram a ser tratados até como vagabundos. Os governos neoliberais responsabilizam os professores e demais funcionários públicos pelo desajustes financeiros da máquina estatal.

O magistério gaúcho, liderado pelo Cpers, volta e meia precisa sair às ruas para se defender. No caso, a melhor defesa acaba sendo o ataque. Um sindicato é um organismo político. Não pode mentir por ideologia. Mas não pode se restringir a pedir aumento salarial, sonho ideológico da direita. Os professores gaúchos, quando se manifestam, não queimam carros nem prefeituras. São quase pacatos. Insultam menos do que torcedores num estádio de futebol e muito menos do que os seus críticos.

Sejamos pateticamente francos: a sociedade e os governos ao longo do tempo no Rio Grande do Sul têm ignorado os professores. A sociedade quer boa educação, qualidade de ensino, mestres dedicados, escolas de Primeiro Mundo. Mas quer também pagar pouco. Ou quase nada. Exige que das escolas saiam jovens críticos, mas gostaria que os professores não se comportassem política e criticamente.

As greves dos professores franceses podem durar meses e dobram governos. É coisa de nação atrasada, subdesenvolvida e pobre. Um país rico como o Brasil pode se dar o luxo de maltratar seus professores e de não mudar seu modelo de investimento para melhorar realmente a vida dos que se dedicam a educar os filhos dos outros. É por isso que famílias não sonham mais em manter os filhos na escola. Querem é que eles entrem em escolinhas. De futebol. Ser mãe era padecer no paraíso. Ser professor é padecer no Rio Grande. Por aqui, melhorar o Estado significa piorar as condições de vida do magistério.

Juremir Machado da Silva é jornalista e professor

Artigo publicado no jornal Correio do Povo, de Porto Alegre, edição do dia 15 de agosto de 2009

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